No último final de semana, mais uma vez o futebol brasileiro precisou parar para reagir ao que não deveria mais ser pauta em pleno 2025: declarações machistas vindas de um profissional que ocupa um dos cargos mais estratégicos do esporte, o técnico de uma equipe de elite do Campeonato Brasileiro.
Ramón Díaz, técnico do Internacional, protestou contra a arbitragem ao afirmar publicamente:
“Futebol é para homens, não é para meninas. É para homens.”
(Coletiva pós-jogo, Brasileirão 2025)
É quase inacreditável que, em um momento em que o futebol feminino bate recordes de público, investimento e audiência, no Brasil e no mundo, ainda existam vozes insistindo em empurrar o esporte de volta para a idade da pedra.
Mais grave ainda: não é a primeira vez
Em 2024, quando treinava o Vasco, Díaz já havia questionado a capacidade de uma árbitra de VAR, insinuando que seria “complicado” uma mulher decidir um lance importante no futebol de alto rendimento. Depois, desculpou-se, alegando má interpretação.
Em 2025, o roteiro se repetiu:
declaração machista, repercussão, desculpas formais e nota institucional. A narrativa muda. O padrão permanece.
O mercado não comporta mais discursos arcaicos
O futebol feminino já deixou há muito tempo de ser “promessa”.
- É realidade.
- É negócio.
- É resultado.
O Brasil será sede da Copa do Mundo Feminina de 2027. Clubes que investem de forma séria já colhem retorno técnico e financeiro.
Mais mulheres ocupam cargos de liderança, gestão, análise de desempenho, arbitragem, preparação física e direção executiva.
O esporte mudou.
O discurso ultrapassado é que não acompanha essa mudança.
Quando um treinador de elite reforça que futebol “é para homens”, ele não está apenas sendo preconceituoso, está desinformado sobre o próprio mercado em que trabalha.
Profissionais que pensam assim não representam o futebol do presente e muito menos o do futuro.
Treinadores formadores têm responsabilidade social
Treinar atletas não é apenas ensinar tática, técnica e sistema de jogo.
É formar caráter, valores e cultura.
Um treinador é espelho.
- Ele influencia jovens jogadores.
- Modela comportamentos.
- Constrói mentalidades.
Por isso, não é aceitável que profissionais responsáveis por formar atletas reproduzam discursos machistas, que estimulam preconceito, desrespeito e exclusão. Cada fala dessa sustenta uma cadeia de torcedores, jogadores e profissionais que acreditam que o futebol deve continuar sendo um território masculino.
Quem forma atletas tem o dever de formar cidadãos, e não perpetuar estereótipos que já deveriam estar extintos.
Competência não tem gênero. Ignorância tem limite.
A cada vez que uma mulher entra em campo, apita um jogo, analisa um desempenho, assina um contrato de gestão ou toma uma decisão no VAR, o futebol evolui.
A cada vez que um profissional insiste em desqualificar mulheres, o futebol regride.
E mais: as mulheres já contribuíram, por décadas, com o futebol masculino, cuidando de torcidas, organizando clubes, sendo as primeiras incentivadoras de atletas, investindo tempo, energia e vida. Muitas vezes, sem receber reconhecimento algum.
Enquanto isso, a história mostra que:
No Brasil, mulheres foram proibidas por lei de jogar futebol entre 1941 e 1979.
Durante quase 40 anos, enquanto homens eram incentivados, financiados e celebrados, mulheres eram proibidas por lei de sequer entrar em campo.
Ou seja: se existe dívida histórica no futebol, ela não é das mulheres com o esporte.
É do futebol com as mulheres.
Hoje, não se trata mais de pedir espaço.
Trata-se de reparar um apagamento histórico.
Chegou a hora de transformar também o comportamento de torcedores que ainda insistem em sustentar o machismo no futebol.
Estamos em outra era. O mundo mudou. O futebol mudou.
Quem resiste à evolução… fica para trás
Lugar de mulher é onde ela quiser. Inclusive decidindo o jogo.
O próprio Internacional, corretamente, afirmou:
“Lugar de mulher é onde ela quiser.”
E é exatamente isso que deveria ser óbvio.
O futebol é, e sempre será, um espaço de mérito, competência e evolução.
Não de gênero.
O futuro do futebol já começou.
Quem ainda não entendeu isso, está ficando para trás.





