A declaração machista de Ramón Díaz, técnico do Internacional

A declaração machista do técnico Ramón Díaz, do Internacional
O técnico Ramón Díaz, do Internacional (RS), é reincidente em proferir falas machistas. (Foto: Ricardo Duarte / Internacional)

No último final de semana, mais uma vez o futebol brasileiro precisou parar para reagir ao que não deveria mais ser pauta em pleno 2025: declarações machistas vindas de um profissional que ocupa um dos cargos mais estratégicos do esporte, o técnico de uma equipe de elite do Campeonato Brasileiro.

Ramón Díaz, técnico do Internacional, protestou contra a arbitragem ao afirmar publicamente:

“Futebol é para homens, não é para meninas. É para homens.”
(Coletiva pós-jogo, Brasileirão 2025)

É quase inacreditável que, em um momento em que o futebol feminino bate recordes de público, investimento e audiência, no Brasil e no mundo, ainda existam vozes insistindo em empurrar o esporte de volta para a idade da pedra.

Mais grave ainda: não é a primeira vez

Em 2024, quando treinava o Vasco, Díaz já havia questionado a capacidade de uma árbitra de VAR, insinuando que seria “complicado” uma mulher decidir um lance importante no futebol de alto rendimento. Depois, desculpou-se, alegando má interpretação.

Em 2025, o roteiro se repetiu:
declaração machista, repercussão, desculpas formais e nota institucional. A narrativa muda. O padrão permanece.

O mercado não comporta mais discursos arcaicos

O futebol feminino já deixou há muito tempo de ser “promessa”.

  • É realidade.
  • É negócio.
  • É resultado.

O Brasil será sede da Copa do Mundo Feminina de 2027. Clubes que investem de forma séria já colhem retorno técnico e financeiro.

Mais mulheres ocupam cargos de liderança, gestão, análise de desempenho, arbitragem, preparação física e direção executiva.

O esporte mudou.

O discurso ultrapassado é que não acompanha essa mudança.

Quando um treinador de elite reforça que futebol “é para homens”, ele não está apenas sendo preconceituoso, está desinformado sobre o próprio mercado em que trabalha.

Profissionais que pensam assim não representam o futebol do presente e muito menos o do futuro.

Treinadores formadores têm responsabilidade social

Treinar atletas não é apenas ensinar tática, técnica e sistema de jogo.
É formar caráter, valores e cultura.

Um treinador é espelho.

  • Ele influencia jovens jogadores.
  • Modela comportamentos.
  • Constrói mentalidades.

Por isso, não é aceitável que profissionais responsáveis por formar atletas reproduzam discursos machistas, que estimulam preconceito, desrespeito e exclusão. Cada fala dessa sustenta uma cadeia de torcedores, jogadores e profissionais que acreditam que o futebol deve continuar sendo um território masculino.

Quem forma atletas tem o dever de formar cidadãos, e não perpetuar estereótipos que já deveriam estar extintos.

Competência não tem gênero. Ignorância tem limite.

A cada vez que uma mulher entra em campo, apita um jogo, analisa um desempenho, assina um contrato de gestão ou toma uma decisão no VAR, o futebol evolui.

A cada vez que um profissional insiste em desqualificar mulheres, o futebol regride.

E mais: as mulheres já contribuíram, por décadas, com o futebol masculino, cuidando de torcidas, organizando clubes, sendo as primeiras incentivadoras de atletas, investindo tempo, energia e vida. Muitas vezes, sem receber reconhecimento algum.

Enquanto isso, a história mostra que:

No Brasil, mulheres foram proibidas por lei de jogar futebol entre 1941 e 1979.

Durante quase 40 anos, enquanto homens eram incentivados, financiados e celebrados, mulheres eram proibidas por lei de sequer entrar em campo.

Ou seja: se existe dívida histórica no futebol, ela não é das mulheres com o esporte.
É do futebol com as mulheres.

Hoje, não se trata mais de pedir espaço.
Trata-se de reparar um apagamento histórico.

Chegou a hora de transformar também o comportamento de torcedores que ainda insistem em sustentar o machismo no futebol.
Estamos em outra era. O mundo mudou. O futebol mudou.

Quem resiste à evolução… fica para trás

Lugar de mulher é onde ela quiser. Inclusive decidindo o jogo.

O próprio Internacional, corretamente, afirmou:

“Lugar de mulher é onde ela quiser.”

E é exatamente isso que deveria ser óbvio.

O futebol é, e sempre será, um espaço de mérito, competência e evolução.
Não de gênero.

O futuro do futebol já começou.

Quem ainda não entendeu isso, está ficando para trás.

Foto de Edinalva Brito Gomes

Edinalva Brito Gomes

Advogada Desportiva, especialista em Direito no Futebol, Prática advocatícia em Direito Família e Cível. Pós-graduada em Direito Público - Direito e Processo Trabalhista. Membro da Comissão Direito Desportivo da OAB/ES e Membro do Tribunal de Justiça Desportiva Unificado - TJDU/ES. Presidente da CAAES Mulher, Coordenadora da Seleção de futebol Capixaba de advogadas 2022/2023, Vice-Presidente da Diretoria CAAES Esportes e Coordenadora das Modalidades de Esportes Femininos da CAAES. Presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Mulher (COMDDIM-VV). Presidente Fundadora do Projeto Sempre Vivas ES. Ao longo da trajetória profissional, tem se dedicado à prática advocatícia com um enfoque humanista, sempre buscando promover a justiça e os direitos humanos, com uma atuação marcada pelo compromisso com a ética, a responsabilidade social e a liderança.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *